de Ílhavo a Oeiras passando por Moçambique

um blog de Manuel Machado da Graça, onde se vão publicando textos e gravuras que ele nos deixou, fotos e outras recordações.

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Localização: Maputo, Mozambique

sábado, agosto 25, 2007

SONETOS

Da mesma série dos sonetos já publicados aqui vão mais 3. Datados de Braga e de Coimbra.
O primeiro é a despedida do quarto onde viveu em Coimbra no seu ano de caloiro.

A DESPEDIDA

É ser ingrato, talvez, deixar-te agora

Quando já estava tão habituado

Mas tem de ser, amigo. É o meu fado,

Que m´ obriga a sair daqui p´ra fora.

Adeus ó quarto. Adeus que vou-me embora.

Vou deixar-te sozinho, abandonado,

Talvez que alegre, e talvez torturado

A pensar no futuro a toda a hora.

Passei aqui um ano ou quasi um ano,

Sonhando à noite belos sonhos d´ oiro.

Passei o tempo bem sem algum dano.

Não te desejo, ó quarto, um mau agoiro

Pois não era decerto muito humano

Desejá-lo ao meu quarto de caloiro.

Coimbra 1/7/927

O MESTRE

O mestre é o papão negro dos rapazes

Que passam sua vida a estudar,

E é porque não são disso capazes,

Senão depressa os punham a cavar.

Contra ele são os ditos mais mordazes

Que se possam no Lexicon achar,

São uns entes tão diferentes que as pazes

Entre eles, nunca mais se podem dar.

Parece verem o mestre contente

Quando algum se está esticando

Tendo da cólica, a dor mais pungente.

Por isso ouvi dizer, já não sei quando:

Acabem-se c´os mestres de repente,

Pois são no mundo, o crime mais nefando.

Braga, 6/7/926

O EXAME

Hav´rá coisa mais chata que o exame

P´ra quem não sabe dele patavina?

Que não estudou nenhuma disciplina

Ou outra coisa qu´assim também se chama?

Não. Não há coisa que menos se grame

E que aos cábulas seja tão mofina,

Do que essa tão reles sabatina

À qual o burro douto chama exame.

É no seu tempo qu´a cólica aperta

Fazendo-nos andar de diarreia,

Por parecer-nos ter a gata certa.

A gata, essa bichana qu´é tão feia

E contra a qual é preciso andar alerta

Pois é o que mais o cábula receia.

Braga, 24/7/1926